28 de fevereiro de 2016

A Efemeridade do Mundo Líquido e Seu Reflexo nas Relações Ambientais

Vivemos em um mundo bombardeado por informações veiculadas por jornais, revistas, TV e internet. E sem dúvida alguma, a internet foi um dos maiores inventos tecnológicos no que diz respeito a este quesito, tanto é que este período é também conhecido como “Era da Informação”. Contudo, apesar do grande fluxo de dados, a reflexão sobre os fenômenos e acontecimentos relevantes para a sociedade, de modo geral, não são aprofundados, o que geralmente acontece é um acúmulo de informações que não são “digeridas”, pois não se há tempo para tal. Dessa forma, são facilmente esquecidas. Mas, é importante ressaltar que as intencionalidades da grande mídia também é um fator agregado a esse fenômeno, dado à importância com que alguns assuntos são reportados (quando reportados), haja vista, por exemplo, o grande desastre ecológico que ocorreu recentemente em Mariana e que pouco se ouve falar a respeito.

Essa quantidade de informação demonstra a dinamicidade social em que vivemos, não sendo restritas apenas à informação, mas podemos ampliar e pensar o quão rapidamente substituímos ou adiamos relações e processos afetivos, emocionais, sociais, políticos ou comerciais com finalidade apenas de satisfação instantânea. Esta frequente mudança, segundo Zygmunt Bauman (2004), é o que caracteriza “o líquido cenário da vida moderna”, governado pelo desejo em detrimento do amor.
O amor, de acordo com Bauman, é “vontade de cuidar, e de preservar [...] Mas também pode significar expropriação e assumir responsabilidade”. Em contrapartida, o desejo “é a vontade de consumir. Absorver, devorar, ingerir e digerir – aniquilar”. Contudo, o desejo precisa ser cultivado, o que demanda tempo, impondo assim, o adiamento da satisfação. 

Nesse mundo líquido, regido pela velocidade e aceleração, esperar é um sacrifício detestável e no quesito consumo, esta barreira pode ser superada com o surgimento dos cartões de crédito, por exemplo, reforçando a cultura do consumo, e assim as pessoas passam a agir por impulsos, através do surgimento de falsas necessidades. 
No entanto, suprir a demanda de consumo tem se tornado insustentável ao planeta, pois a prática de consertar ou reutilizar os produtos vem sendo deixada de lado cada vez mais. As mercadorias em perfeitas condições de uso são rapidamente trocadas por outras após o surgimento de uma nova versão aperfeiçoada. Isso sem contar o uso crescente de materiais descartáveis com a justificativa de praticidade e “ganho de tempo”. Essa busca por mudanças, agilidade e movimento constante, nos definem como “habitantes do líquido mundo moderno” (BAUMAN, 2004). Ou seja, nossos hábitos exigem cada vez mais da natureza, não permitindo a esta o tempo necessário para a sua regeneração.

Nessa perspectiva, a educação é uma alternativa para esse modelo, e cabe à educação ambiental participar do processo emancipatório dos indivíduos, nutrindo uma reflexão crítica com relação a estrutura social estabelecida a fim de alterar padrões e valores para que caminhemos para sociedades mais sustentáveis. Assim, uma forma para essa transformação é a sensibilização e o autoconhecimento, elementos de uma educação ambiental complexa, que compreende uma visão integrada do mundo, de modo que considera a qualidade de vida para todos os seres vivos.
À vista disto, Paulo Freire traz alguns pressupostos que contribuem com o processo de busca de emancipação e percepção do indivíduo como integrante do meio ambiente tendo em vista sua inserção crítica nessa realidade. Dessa forma, torna-se capaz de identificar problemáticas de seu entorno para que atue como agente transformador dessa realidade. Contudo, dentre seus pressupostos, gostaria de destacar o amor como ato de liberdade e como fundamento do diálogo no processo de ensino-aprendizagem, tendo em vista a relação de amar trazida por Bauman:

Amar é contribuir para o mundo, cada contribuição sendo o traço vivo do eu que ama. No amor, o eu é, pedaço por pedaço, transplantado para o mundo. O eu que ama se expande doando-se ao objeto amado [...]

Dessa forma, a Educação Ambiental pautada na solidariedade, na amorosidade e na participação - que são fundamentos da emancipação - é um caminho contrário à ideia e representação do mundo líquido em que vivemos. Tornando possível a criação de relações de afetividade e sentimento de pertencimento como elemento integrante da natureza, constituindo assim, uma visão ecossistêmica, holística.
Daniele Bispo

Referência Bibliográfica
BAUMAN, Z. Amor líquido: sobre a fragilidade dos laços humanos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2004.
LOVATTO, P. B.; ALTERMBURG, S. N.; CASALINHO, H.; LOBO, E. A. Ecologia profunda: o despertar para uma educação ambiental complexa. Redes, Santa Cruz Sul. v.16, n.3, p.122-137. 2011
Brasil, Ministério do Meio Ambiente. Identidades da educação ambiental brasileira. Brasília, 2004. 156 p

Para Refletir
O que é meio ambiente? https://www.youtube.com/watch?v=suJugh8-cts

Nota
Zygmunt Bauman, sociólogo polonês, escreveu diversas obras sobre esse mundo pós-moderno, denominado por ele de “Mundo Líquido”, termo foi tido a partir da ideia retirada de uma das frases mais conhecidas de Marx “tudo que é sólido desmancha no ar”.
Referencia Imagem: https://www.google.com.br/search?q=mundo+l%C3%ADquido&biw=1920&bih=935&source=lnms&tbm=isch&sa=X&sqi=2&ved=0ahUKEwi8rdb21prLAhWKlZAKHbCxABMQ_AUIBygC#imgrc=4GX26VzJ3bOW9M%3A

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